22/05/2014
Lei dá isenção para falida quitar dívida. 

A presidente Dilma Rousseff concedeu, por lei, um benefício tributário que dispensa empresas falidas e em liquidação de recolher o imposto de renda sobre ganhos de capital quando o dinheiro da venda de bens for usado para quitar dívidas com a União. A expectativa é que a nova lei permita que os bancos que têm dívidas bilionárias com a União desde a instituição do Proer, programa de socorro instituído em 1995 com recursos públicos, consigam, agora, pagá-las com mais facilidade.

A legislação deverá beneficiar notadamente os bancos Nacional e Econômico que, juntos, devem R$ 46,8 bilhões à União, mas não se limitará a eles. O ganho tributário se aplicará a qualquer empresa em liquidação judicial, extrajudicial ou falência.

O governo sustenta que não haverá prejuízo porque a medida acelera o encerramento das liquidações e falências, resultando na quitação de dívidas num prazo mais curto. "[A decisão] não implica em qualquer renúncia ou benefício fiscal e apenas viabiliza o pagamento mais célere de dívidas com a União, já que a sistemática anteriormente vigente levava ao pagamento desse tipo de dívida diferido ao longo de anos", informou a assessoria de imprensa do Ministério da Fazenda.

Incluída no artigo 109 da MP 627, transformada na Lei 12.973 sancionada há duas semanas por Dilma, está a permissão para que qualquer empresa inativa, em falência ou em liquidação use prejuízos fiscais para abater até 100% do IR devido sobre ganhos de capital, desde que o dinheiro da operação de venda dos bens ou direitos seja usado para quitar dívidas com a União. Até a sanção da lei, as empresas só podiam abater 30% do imposto com prejuízos de anos anteriores, tendo que pagar os 70% restantes em dinheiro. O IR sobre ganhos de capital é devido sempre que um bem ou direito é revendido por valor acima daquele que está registrado na contabilidade da empresa. A diferença é tributada pelo governo em 15%.

Relatada pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a MP 627 não incluía em seu texto original o benefício tributário. Apesar de ter sido incluída no Congresso, a mudança foi diretamente negociada com a equipe do ministro da Fazenda, Guido Mantega. O Valor apurou que o texto transformado em lei foi redigido pela Receita Federal. Em parecer, o Fisco fala em estímulo à alienação de bens e recebimento de recursos pela União. A Fazenda também capitaneou as sugestões de vetos à MP e a lista não incluiu o artigo 109.

Na prática, o novo benefício significa que as empresas deixarão de desembolsar recursos para pagar o IR e, portanto, terão mais dinheiro em caixa para quitar as dívidas da massa falida. O efeito sobre as contas do governo, portanto, tende a ser neutro. A Receita deixará de arrecadar o IR sobre o ganho de capital, mas o dinheiro terá que ser usado pelas empresas para pagar a dívida do Proer, no caso dos bancos, ou débitos tributários, no das demais pessoas jurídicas.

Na análise do governo, a medida também será neutra para os ex-donos de empresas e bancos falidos. Eles não verão um aumento em seus patrimônios porque vão usar outra moeda para pagar o imposto devido. Em vez de desembolsar dinheiro vivo, terão que dar baixa no valor de seus créditos tributários, que também são ativos incluídos na contabilidade e com valor de mercado. Quando usam prejuízos para abater impostos, as empresas o fazem na razão de um para um. Já as negociações para compra de créditos tributários são feitas com deságio.

As autoridades argumentam que a trava que restringe o valor que pode ser abatido com prejuízos fiscais a 30% do IR devido é ineficiente. No caso de falências e liquidações, o que se observa é que a massa falida vende ativos na exata medida dos prejuízos fiscais a que pode abater, evitando o desembolso de recursos com o pagamento do IR sobre ganhos de capital. Quando há operações de alto valor, cuja venda implica recolhimento elevado de IR, o bem acaba não sendo vendido e o processo de fechamento das empresas se arrasta, segundo a visão do governo.

No caso do Nacional, a mudança na regra do IR será especialmente importante. A instituição, controlada pela família Magalhães Pinto, tem R$ 22 bilhões em títulos do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) que precisam ser trocados por papéis com valor de mercado que são emitidos pelo Tesouro Nacional, numa operação conhecida como novação, para quitar sua dívida com o governo, que é de R$ 31,8 bilhões. Esses papéis estão escriturados na contabilidade a valores históricos. Quando forem trocados pelos títulos novos, chamados de CVS, e vendidos ao mercado ou entregues ao governo como pagamento da dívida, o IR sobre ganho de capital teria que ser pago.

Da dívida total do Nacional, R$ 29,1 bilhões devem ser quitados junto ao BC e outros R$ 2,3 bilhões com a Receita. O banco tem ainda R$ 500 milhões em dívidas trabalhistas e R$ 400 milhões em discussão na esfera administrativa, além de outros credores.

Na avaliação de Marcelo Fontes, advogado da família Magalhães Pinto, "não havia sentido" em se manter o limite de abatimento de 30% do IR para empresas em liquidação ou em regime falimentar. "Todos os bancos em liquidação entraram com ações contra essa trava na Justiça. Vamos imaginar que o Nacional tenha um ganho de capital e só possa usar 30% do prejuízo (para abatimento do IR). Ele é obrigado a recolher imposto sobre 70%. Uma empresa viva não tem esse problema, porque usa os 30% num ano e usa mais 30% no outro. Ela tem o tempo a favor dela para compensar. Mas a função do Nacional é apurar ativo e pagar passivo", explicou o advogado.

O Banco Econômico deve cerca de R$ 15 bilhões ao governo, dos quais R$ 10,7 bilhões terão de ser quitados com o BC, R$ 1 bilhão com o Fisco, R$ 3,3 bilhões em discussão administrativa, R$ 19 milhões de passivo trabalhista e cobranças de credores privados.

Natalício Pegorini, administrador da massa do Econômico, informou que pediu um estudo para verificar quais tipos de ganhos de capital podem ser utilizados para obter benefícios fiscais pela nova legislação. Segundo ele, é preciso verificar se a recuperação de créditos poderá ser utilizada como ganho de capital para efeito de obter o benefício do artigo 109. "Estou aguardando a regularização da Receita porque essa lei fala em qualquer ganho de capital", disse. Ele informou que o Econômico tem aproximadamente R$ 8 bilhões em FCVS que, se forem convertidos em CVS e aceitos como ganho de capital, o Econômico poderá abater valores na Receita.

Com o Refis dos bancos, em 2010, o governo Lula concedeu descontos de até 45% sobre os juros, à vista ou em parcelas de até 15 anos aos bancos socorridos pelo Proer. Agora, a compensação dada por Dilma será para ganhos de capital com a venda de ativos para pagar passivos com a União. É mais um alívio para bancos com dívidas bilionárias junto ao governo.

Fonte: Valor Econômico 
 
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